Aposta de Amor por Candace Camp - Versão HTML
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Aposta de Amor
Candace Camp
The marriage wager
Serie “As Casamenteiras” 01
Já não era uma mocinha, e, além disso, não tinha dote.
Assim, a senhorita Constance Woodley não entendia por que tinha despertado o
interesse de uma das mais respeitadas damas da alta sociedade de Londres.
Entretanto, com a ajuda de sua benfeitora, transformou-se em uma fascinante
criatura que chamou a atenção do bonito, encantador e ligeiramente libertino Lorde
Dominic Leighton.
E, ante o olhar de assombro de toda Londres, a presente ninguém e o visconde
libertino demonstraram que, inclusive no cruel mercado do matrimônio, quando o
amor estava em jogo, todas as apostas eram válidas.
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Candace Camp
[As Casamenteiras 01]
Disponibilização e Tradução: Vick
Revisão: Edith
Revisão Final e Formatação: Clara
PROJETO REVISORAS TRADUÇÕES
Capítulo 1
Lady Haughston contemplou à multidão que havia abaixo dela, com uma
mão apoiada ligeiramente no corrimão de nogueira negra e brilhante. Era
consciente de que a as pessoas se viravam para olhá-la. De fato, teria se
sentido decepcionada se não fosse assim.
Francesca Haughston tinha sido uma das belezas reinantes da alta
sociedade durante mais de uma década; aos trinta e três anos, não lhe
interessava o fato de ser precisa quanto ao tempo que tinha transcorrido desde
sua apresentação em sociedade. A natureza a tinha dotado com uma grande
beleza: tinha o cabelo loiro, quase dourado, os olhos azuis e grandes, a pele
suave e branca, o nariz reto, ligeiramente arrebitado, e os lábios um pouco
curvados para cima pelas comissuras, o que conferia a seu sorriso um ar
vagamente felino. Tinha também um pequeno lunar na face, perto da boca,
cujo único efeito era o de acentuar a perfeição de seus traços. Era de estatura
média, mas suas formas esbeltas e seu porte elegante faziam com que
parecesse mais alta.
Entretanto, inclusive com todas as vantagens que a natureza tinha
concedido a Francesca, ela sempre se assegurava de aparecer em público
impecavelmente arrumada e de modo que suas características se vissem ainda
mais realçadas. Sempre levava os melhores vestidos, o calçado que melhor
complementasse os trajes e o penteado que mais favorecesse ao seu rosto.
Seu traje sempre seguia os ditados da última moda, mas ela não escolhia as
tendências passageiras, porém só aquelas cujos matizes ressaltassem melhor
a cor de sua pele, de seus olhos e de seu cabelo, e os estilos que mais
embelezassem sua figura.
Aquela noite usava um vestido de cetim, de cor azul clara, com o decote à
altura adequada para deixar à vista, de uma maneira sedutora, mas não
vulgar, os seios e seus ombros brancos e suaves. O decote estava adornado
com bordado prateado, que também rematava os baixos do vestido e que se
derramava como uma cascata pela meia cauda na traseira da saia. Levava um
simples, mas maravilhoso colar de diamantes e um bracelete a jogo, e também
um penteado com alguns brilhantes disseminados pelo cabelo.
Francesca estava segura de que ao vê-la ninguém se teria imaginado que
suas finanças eram bem parcas. A verdade era que seu defunto marido, do
qual não tinha saudades, absolutamente, Lorde Andrew Haughston, tinha
morrido lhe deixando em herança enormes dívidas por causa de seu vício de
jogo e de apostas. Ela tinha tido trabalho para ocultar aquela realidade.
Ninguém sabia que as jóias que levava eram cópias das verdadeiras, que tinha
tido que vender. Tampouco ninguém, nem sequer a mais vivida das damas da
sociedade londrina, suspeitava que tivesse cuidado dos sapatos que levava
com esmero, de modo que já estavam em sua terceira temporada. Nem que
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seu vestido estava confeccionado a partir de outro que tinha usado durante a
temporada anterior, e que sua habilidosa criada tinha convertido em um traje
digno da moda francesa mais recente.
Um dos poucos que conheciam sua situação verdadeira era o homem
elegante e esbelto que estava ao seu lado, sir Lucien Talbot. Ele se tinha unido
ao círculo de admiradores de Francesca durante sua primeira temporada,
quando era uma mocinha , e embora o interesse romântico que tinha mostrado
por ela não fosse mais que uma agradável ficção em que os dois participavam;
sua devoção por ela era bastante real, e durante os anos que tinham
transcorrido, tinham chegado a ser grandes amigos.
Sir Lucien era um homem muito elegante e engenhoso, e aquelas duas
características, unidas ao seu estado de perpétuo celibato, convertiam-no em
um convidado muito procurado nas festas. Era bem sabido que não tinha
dinheiro, como toda a família Talbot, mas isso não prejudicava sua reputação
nem lhe impedia de acessar aos círculos mais seletos; esta era uma qualidade
que as anfitriãs da alta sociedade tinham em muito alta consideração. Sempre
se podia contar com ele para que animasse uma conversa com um ou dois
comentários mordazes, nunca fazia cenas, era um bailarino excelente e seu
selo de aprovação para uma festa era suficiente para estabelecer a boa
reputação de um anfitrião.
- Vá, que multidão - comentou naquele momento, observando com o
monóculo às pessoas que havia abaixo deles.
- Acho que Lady Welcombe tem a profunda convicção de que um baile
deve estar o mais concorrido possível, com o único limite de que os convidados
tenham espaço para dançar. - concordou Francesca, enquanto se abanava com
frouxidão - Receio descer. Sei que pisarão em mim, sem remédio.
- E não é esse o objetivo de um baile?
Aquela pergunta tinha sido formulada por uma voz grave que provinha de
trás, ligeiramente à direita. Francesca conhecia aquela voz.
- Rochford - disse antes de voltar à cabeça - Surpreende-me encontrá-lo
aqui.
Lucien e Francesca viraram para saudar o recém-chegado, que fez uma
ligeira reverência e respondeu:
- Seriamente? Parece-me que alguém pode pensar que verá todos seus
conhecidos neste baile.
Depois, apertou os lábios com uma careta familiar que era quase, embora
não de tudo, um sorriso. Chamava-se Sinclair e era o quinto duque do
Rochford, e se a presença do Lucien era solicitada pelas anfitriãs, a assistência
do Rochford a uma festa era a máxima aspiração de todas elas.
Rochford era um homem alto, magro e de ombros largos. Ia vestido de
impecável negro e branco, tal e como se requeria nas ocasiões formais; levava
um broche de rubis no lenço do pescoço e abotoaduras a jogo. Era um dos
homens mais poderosos da aristocracia, e, além disso, muito bonito. Seu
comportamento, igual a sua forma de vestir, era elegante e discreto. Causava
admiração entre os homens por sua habilidade no manejo dos cavalos e por
sua certeira pontaria, e era perseguido pelas mulheres devido a sua grande
fortuna, suas maçãs do rosto marcadas e seus olhos negros. Tinha quase
quarenta anos e nunca se casara, e como conseqüência, converteu-se no
desespero da maioria das damas da alta sociedade, inclusive daquelas com
mais determinação.
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Francesca não pôde evitar sorrir um pouco ante sua resposta.
- Provavelmente têm razão.
- Como sempre, é uma visão, Lady Haughston - disse Rochford.
- Uma visão? - perguntou Francesca, arqueando uma de suas delicadas
sobrancelhas - Me dou conta de que não disse que tipo de visão. Poderiam
encontrar-se muitas formas de terminar essa frase.
Brilharam os olhos de Rochford, mas respondeu em tom neutro:
- Ninguém que tivesse olhos imaginaria algo que não fosse uma visão de
beleza.
- Uma excelente recuperação - lhe disse Francesca.
Sir Lucien se inclinou para Francesca e lhe sussurrou:
- Não olhe. Lady Cuttersleigh está se aproximando.
Uma mulher alta e muito magra se aproximava deles, seguida de seu
marido, um homem baixo e robusto. Lady Cuttersleigh era filha de um conde,
mas se tinha casado com um barão, e costumava recordar a seu marido, e ao
resto do mundo, que seu matrimônio estava abaixo de suas possibilidades.
Considerava que era seu dever casar a suas numerosas filhas com alguém
digno de sua elevada linha de sangue.
Entretanto, dado que suas filhas se pareciam muito a ela no físico e o
caráter, estava-lhe sendo difícil. Aquela era uma das poucas mulheres que não
tinha retrocedido no empenho de conseguir o duque do Rochford como genro.
Rochford fez uma leve careta de dor antes de voltar-se e executar uma
perfeita reverência para saudar o casal que se aproximara.
- Minha senhora Cuttersleigh.
- Lady Haughston - disse Lady Cuttersleigh para saudar Francesca, e
depois assentiu desinteressadamente para sir Lucien, cujo título estava muito
abaixo de suas aspirações. Virou-se novamente para o Rochford com um
sorriso e afirmou - Maravilhosa festa, não acham? A festa da temporada, diria
eu.
Rochford não disse nada, limitou-se a sorrir com dissimulação.
- Pergunto-me quantas festas da temporada haverá este ano - ironizou sir
Lucien.
Lady Cuttersleigh o olhou com desdém.
- Só pode haver uma.
- OH, me parece que haverá três, ao menos - interveio Francesca - Uma
delas é a que conta com uma maior assistência de convidados, que será esta,
certamente; mas também há a festa ganhadora deste ano quanto ao luxo com
o que está decorada a casa.
- E também há a que ganhará pela importância dos convidados que forem
- acrescentou sir Lucien.
- Bom, eu sei que minha Amanda sentirá ter perdido esta - disse Lady
Cuttersleigh.
Francesca e Lucien se olharam, e Francesca abriu seu leque e o ergueu
até seu rosto para ocultar seu sorriso. Fora qual fosse o assunto de que
estivessem falando, Lady Cuttersleigh arranjava um jeito para pôr suas filhas
na conversa.
Lady Cuttersleigh começou a descrever detalhadamente a febre que tinha
prostrado as suas duas filhas mais novas, e a maneira tão comovedora em que
sua filha mais velha, Amanda, ficou em casa para cuidar delas. Francesca se
perguntou onde estava o instinto maternal daquela mulher, pois era sua filha
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que tinha tido que ficar cuidando das duas meninas doentes.
Lady Cuttersleigh seguiu espraiando-se com as virtudes da Amanda até
que Rochford interveio.
- Sim, minha senhora, está claro que sua filha mais velha é uma Santa.
Verdadeiramente, entendo que só o mais virtuoso dos homens seria um marido
apropriado para ela. Posso sugeri-la ao reverendo Hubert Paulty? É um homem
excelente, e muito adequado para ela.
Lady Cuttersleigh ficou sem palavras. Olhou ao duque com abatimento,
piscando rapidamente e tentando recuperar-se daquele golpe para retomar
seus esforços.
Rochford, entretanto, foi muito rápido para ela.
- Lady Haughston, acho que me tinha prometido que me apresentaria a
seu estimado primo - disse a Francesca, lhe oferecendo o braço.
Francesca lhe lançou um olhar divertido, e lhe disse em um tom de voz
recatado:
- É obvio. Se nos desculparem, Lady Cuttersleigh. Sir Lucien.
Sir Lucien se inclinou para ela e sussurrou:
- Traidora.
Francesca não pôde reprimir um risinho enquanto se afastava pelo braço
do Rochford.
- Meu estimado primo? – repetiu - Refere-se ao que tanto carinho professa
a seu oponente, ou ao que fugiu ao Continente depois de um duelo?
Um vago sorriso se desenhou nos lábios do duque.
- Refiro-me, minha formosa senhora, a qualquer que possa me liberar de
Lady Cuttersleigh.
Francesca sacudiu a cabeça.
- Que mulher tão horrível. Está assegurando celibato de todas suas filhas
com esses esforços para casá-las. Não só é muito torpe na hora de impor-lhe
às pessoas, mas também suas expectativas excedem com muito as
possibilidades das moças.
- Você, conforme percebo, é uma perita nesses assuntos – disse Rochford,
em um tom ligeiramente zombador.
Francesca o olhou com as sobrancelhas arqueadas.
- Seriamente?
- Oh, sim. Ouvi dizer que é aquela a que terá de se consultar quando se
faz uma incursão nas tempestuosas águas do mercado do matrimônio.
Entretanto, alguém se pergunta por que você mesma não pôs nas listas de
novo.
Francesca lhe soltou o braço e se voltou para o corrimão para olhar à
multidão que havia abaixo deles.
- Encontro-me a gosto em meu status de viúva, Excelência.
- Excelência? - repetiu ele zombeteiramente - Depois de tantos anos?
Parece-me que a ofendi uma vez mais. Temo que seja bastante propenso a
fazê-lo.
- Sim, parece que é perito nisso - respondeu Francesca - Não, não me
ofendeu. Entretanto, pergunto-me se... estão-me pedindo ajuda?
Ele soltou uma gargalhada.
- Não, não. Só estava conversando.
Francesca se virou de novo para o duque e o observou fixamente,
perguntando-se por que teria puxado aquele assunto. Possivelmente se
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tivessem estendido rumores sobre seus esforços de casamenteira? Durante
aqueles últimos anos, Francesca tinha ajudado a mais de um casal de pais que
estava tentando casar com êxito a uma filha. Esses pais sempre lhe tinham
demonstrado sua gratidão com algum presente, é obvio, depois que Francesca
tinha guiado à moça, sob seu amparo, pelos difíceis caminhos da alta
sociedade para os braços do marido adequado.
Entretanto, aqueles presentes se davam com a máxima discrição por
ambas as partes, e Francesca não entendia como tinha podido saber-se que
certo broche de prata ou certo anel de rubi se empenharam no
estabelecimento de algum prestamista.
Rochford a olhou também, e Francesca detectou a faísca da curiosidade
em seus olhos escuros. Então disse, rapidamente:
- Sem dúvida, acha insignificante essa qualidade.
- Claro que não. Conheci muitas mães formidáveis e empenhadas em
converter a suas filhas em duquesas, muitas para desdenhar os esforços de
uma casamenteira.
- Realmente, é assombroso - continuou Francesca -, contemplar como
muitas dessas mães dirigem a questão da forma mais equivocada. Não só Lady
Cuttersleigh. Olhem a aquelas moças.
Francesca apontou para um grupo que havia abaixo deles, junto ao vaso
de uma palmeira. Uma mulher de meia idade, vestida de cor arroxeada, estava
junto a duas jovens que, claramente, eram filhas dela, tendo em conta a
desafortunada semelhança que havia entre elas.
- Normalmente, as mulheres que não têm idéia de como vestir-se, se
empenham em escolher a roupa de suas filhas - comentou Francesca - Neste
caso, a mãe vestiu às filhas de cor lavanda, um tom mais juvenil do que o
arroxeado que ela usava; e qualquer tom dessa cor é desastroso com sua cor
de pele, porque só serve para fazê-la mais amarelada. Além disso, levam
muitos babados, muito bordado e muitos laços. E olhe como a mãe fala e fala,
sem deixar que suas filhas pronunciem uma só palavra.
- Sim, já vejo - respondeu Rochford - Mas certamente este é um exemplo
extremo. Não acredito que tivessem muitas esperanças inclusive sem uma
mãe tão dominante.
Francesca emitiu um som desdenhoso.
- Eu o conseguiria...
- Vamos, querida... - disse ele, com um olhar de diversão.
Francesca arqueou as sobrancelhas.
- Duvidam de mim?
- Inclino-me acima de tudo seu conhecimento - disse ele -, mas penso que
nem sequer você conseguiria casar certas moças.
Aquele tom zombeteiro irritou Francesca. Sem deter-se para pensar, disse:
- Sim poderia. Poderia fazer que qualquer garota desta sala estivesse
comprometida antes do final da temporada.
Ele conteve um sorriso de um modo decididamente aborrecido e disse
com despreocupação:
- Quer fazer uma aposta?
Francesca pensou que tinha sido impetuosa, mas não podia retirar-se ante
aquele tom de voz de brincadeira.
- Sim, Quero.
- Qualquer moça da sala? -perguntou Rochford.
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- Qualquer moça.
- E tomaria sob seu amparo até que estivesse comprometida com um
candidato aceitável, antes do fim da temporada social?
- Sim - respondeu Francesca, olhando-o com frieza. Ela não era das que se
amedrontavam ante um desafio - E você pode escolher à moça.
- Mas, o que no apostaremos? Vejamos... se eu ganhar, deve aceitar nos
acompanhar, a minha irmã e a mim, quando formos fazer nossa visita anual a
nossa tia avó.
- Lady Odelia? - perguntou Francesca com um pouco de horror.
Quando respondeu, brilhavam os olhos de Rochford.
- Vá, pois claro. Lady Odelia professa um grande carinho a você, se por
acaso não sabia.
- Sim, o mesmo carinho que professa um falcão a um coelho gordo –
respondeu Francesca - Entretanto, aceito porque sei que não vou perder a
aposta. E o que conseguirei eu quando você perder?
Ele a olhou, pensativamente, durante um momento antes de responder:
- Acho que um bracelete de safiras da mesma cor que seus olhos. Acho
que as safiras agradam a você - seus olhares ficaram apanhados um no outro
durante uns instantes. Então, Francesca se virou e disse de maneira insossa:
- Sim, agradam-me. Isso estará bem.
Apertou um pouco seu leque, ergueu o queixo e fez um gesto para os
convidados da festa.
- Bem, a que moça escolhe?
Ela esperava que Rochford escolhesse a uma das duas jovens tão pouco
agraciadas sobre as que tinham estado falando.
- A que leva o enorme laço na cabeça, ou a que leva a pluma abatida?
- A nenhuma - respondeu ele, surpreendendo-a. Depois assinalou,
assentindo, à mulher alta e esbelta que havia atrás das moças, vestida com um
traje cinza simples.
Estava claro, pela simplicidade daquele vestido, que a mulher tinha ido à
festa em qualidade de acompanhante e não de debutante - Escolho a aquela.
***
Constance Woodley estava aborrecida.Supunha-se que devia sentir gratidão, tal e como lhe dizia freqüentemente
sua tia Blanche, por estar em Londres durante a temporada social e por poder
ir a grandes festas como aquela. Entretanto, Constance não podia alegrar-se
muito pelo fato de acompanhar a suas primas a tão numerosos bailes. Havia
uma grande diferença entre desfrutar da temporada social como protagonista,
caso de Georgiana e Margaret, e observar em um segundo plano como alguém
desfrutava daqueles eventos. Sua oportunidade de ter uma temporada social
tinha passado fazia muito tempo.
Quando ela fez dezoito anos e chegou o momento de sua apresentação,
seu pai se havia ficado doente, e ela tinha passado os cinco anos seguintes
cuidando-o enquanto sua saúde decaía progressivamente. Ele tinha morrido
quando ela tinha vinte e três anos, e como sua propriedade estava vinculada
aos herdeiros masculinos e Constance não tinha irmãos, a propriedade tinha
ido parar às mãos de seu tio, Roger. A Constance, solteira e sem meios
econômicos suficientes para manter-se, além da pequena soma que seu pai lhe
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tinha deixado em herança e que tinha investido integralmente em recursos
públicos, tinha permitido que permanecesse na casa quando sir Roger e sua
família se instalaram nela.
Sua tia Blanche lhe havia dito que com eles sempre teria um lar, embora
pensasse que seria melhor que Constance deixasse seu quarto e ocupasse
outro muito menor na parte traseira da casa. O quarto maior, com suas lindas
vistas ao jardim, era mais adequada para as duas filhas dos donos da casa.
Aquele movimento tinha sido um gole amargo para Constance, mas se
tinha consolado pensando que ao menos tinha um quarto para si, e que não
devia compartilhá-lo com suas primas; daquele modo, podia retirar-se ali de
vez em quando para desfrutar da paz e da tranqüilidade.
Constance tinha passado aqueles últimos anos vivendo com seus tios e
suas primas. Tinha ajudado a sua tia com as meninas e com a casa para ser
útil e lhe agradecer o fato de que a tivessem acolhido, mas também porque
estava claro que eles esperavam aquele gesto em compensação pela
habitação e o alojamento.
Pacientemente, Constance economizava e reaplicava os pequenos ganhos
que recebia de sua herança, com a esperança de que algum dia acumularia o
suficiente para poder manter-se e viver sozinha.
Dois anos antes, quando sua prima mais velha, Georgiana, tinha
completado dezoito anos, seu tio e sua tia tinham decidido que, devido aos
gastos que supunha uma estréia, seria melhor esperar que a segunda moça
também fizesse dezoito anos e apresentar em sociedade a suas duas filhas de
uma vez.
Constance podia ir com eles a Londres, havia-lhe dito com deferência sua
tia, em qualidade de dama de companhia das moças. Não se tinha mencionado
que participasse daquele rito social de nenhum outro modo. Embora a
temporada londrina fosse em parte uma espécie de mercado matrimonial para
mães com filhas casadouras, nem Constance nem sua tia pensavam que
Constance fosse um bom partido para nenhum marido. Era uma mulher
atraente; tinha os olhos de cor cinza e grandes e uma cabeleira espessa de cor
castanha escura e avermelhada, mas aos vinte e oito anos se convertera em
uma solteirona, porque fazia tempo que tinha ultrapassado a idade
conveniente para apresentar-se em sociedade. Já não podia vestir-se de cores
claras nem fazer caracóis no cabelo. De fato, a tia Blanche preferia que
Constance levasse uma touca, mas embora Constance aceitasse levá-la
durante o dia, para as festas recusava colocar aquele símbolo definitivo de
suas esperanças malogradas.
Constance fazia todo o possível por cumprir com as expectativas de sua
tia, porque sabia que seus tios não tinham obrigação de acolhê-la depois da
morte de seu pai. Que o tivessem feito principalmente por medo à
desaprovação social e por ter uma criada grátis para suas filhas não eram
motivos suficientes para não lhes professar gratidão.
Entretanto, às vezes lhe era muito difícil suportar o falatório de suas
primas, que eram tolas e inexplicavelmente presunçosas. E embora também
fosse algo presunçoso de sua parte, Constance detestava levar aqueles
aborrecidos vestidos de cor cinza, marron e azul marinho, as cores que sua tia
considerava mais adequadas para uma mulher solteira de certa idade.
Observar às pessoas brilhantes da alta sociedade produzia certo prazer, é
obvio, e Constance estava concentrada naquele passatempo. Estava
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observando ao casal que havia no alto da escadaria, olhando aos convidados
da festa como monarcas que tivessem contemplado a seus súditos. Aquela era
uma analogia idônea, porque o duque do Rochford e Lady Francesca
Haughston estavam entre os membros reinantes da sociedade londrina.
Constance, é obvio, não conhecia nenhum dos dois, porque eles se moviam em
um círculo muito superior ao de seu tio Roger e sua tia Blanche. Só naqueles
eventos tão grandes como aquele baile Constance via-os.
Naquele momento, eles dois começaram a descer pelas escadas, e
Constance perdeu sua visão entre a multidão. Sua tia se virou para ela naquele
mesmo momento e lhe disse:
- Constance, querida, busque o leque da Margaret. Parece que deixou cair.
Constance passou os minutos seguintes procurando o leque, assim não se
deu conta de que se aproximavam duas mulheres até que a respiração agitada
de sua tia a alertou de que acontecia algo estranho. Ergueu a vista e se deu
conta de que Lady Haughston caminhava para eles junto à sorridente anfitriã
da festa, a mesma Lady Welcombe.
- Lady Woodley, sir... né...
- Roger - disse o tio de Constance.
- É obvio, sir Roger. Espero que ambos estejam desfrutando de minha
festa - disse a dama, fazendo um gesto para a grande sala, que estava
abarrotada de gente. Seu sorriso desdenhoso era indicação de que
compreendia o humorístico de seu comentário.
- Oh, sim, minha senhora. É um maravilhoso baile. O melhor da
temporada, asseguro. Justamente estava dizendo ao sir Roger que é o evento
mais esplêndido ao que participamos até agora.
- Bom, a temporada ainda é jovem - replicou Lady Welcombe com
modéstia - Só espero que ainda seja recordado em julho.
- Oh, estou segura de que assim será - disse a tia Blanche, e se apressou a
elogiar profusamente as flores, as velas, a decoração.
Inclusive a anfitriã devia se aborrecer com tanta adulação.
- Por favor, me permitam que os apresente Lady Haughston - disse na
primeira oportunidade que teve, e se virou para Francesca - Lady Haughston,
apresento-lhes sir Roger Woodley e a sua esposa Lady Blanche, e elas são...
né... suas encantadoras filhas.
- Encantada - disse Lady Haughston, estendendo sua esbelta e branca
mão.
- Oh, minha senhora! É uma honra! - exclamou a tia Blanche, sufocada
pela excitação - Me alegro tanto de conhecê-la. Por favor, me permitam que
lhe apresente a nossas filhas, Georgiana e Margaret. Meninas, saúdem Lady
Haughston.
Lady Haughston sorriu levianamente a cada uma das moças e depois se
aproximou de Constance, que estava ligeiramente afastada.
- E quem é você?
- Constance Woodley, senhora - respondeu Constance com uma ligeira
reverência.
- Desculpe - interveio a tia Blanche rapidamente - A senhorita Woodley é a
sobrinha de meu marido, e vive conosco desde que faleceu seu pobre pai, faz
alguns anos.
- Por favor, aceitem minhas condolências - disse Lady Haughston, e
acrescentou depois de uma breve pausa - Pela morte de seu pai.
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- Obrigada, senhora - respondeu Constance.
Percebeu certa diversão nos olhos profundamente azuis da outra mulher,
e não pôde deixar de perguntar-se se Lady Haughston não estava insinuando
algo distinto com o que havia dito. Conteve o sorriso que lhe produziu aquele
pensamento e devolveu o olhar, com amabilidade a Lady Haughston.
Lady Welcombe se despediu e se afastou, mas para surpresa de
Constance, Lady Haughston ficou falando com eles durante uns instantes.
Constance se surpreendeu ainda mais quando a dama disse que devia partir e
se virou para ela.
- Importar-se-ia de dar um passeio comigo pela sala, senhorita Woodley?
Constance ficou muito assombrada para responder. Depois se adiantou
com presteza e disse:
- Sim, eu gostaria muito, obrigada.
Recordou em olhar a sua tia para lhe pedir permissão, embora Constance
soubesse que iria com Lady Haughston embora a tia Blanche o tivesse negado.
Felizmente, sua tia só pôde assentir com perplexidade, e Constance partiu com
Lady Haughston.
Francesca tomou pelo braço e começou a caminhar pela enorme sala,
conversando despreocupadamente.
- Ah, mal se pode ver alguém conhecido entre tal multidão. É impossível
encontrar-se com alguém - comentou.
Constance sorriu em resposta. Ainda estava atônita pelo interesse de Lady
Haughston nela, e não sabia o que dizer, nem sequer lhe ocorria o mais tópico
dos comentários. Não podia imaginar o que queria dela uma das grandes
damas da aristocracia. Não acreditava que Francesca se dera conta, com um
breve olhar, de que Constance era merecedora de sua amizade.
- É esta sua primeira temporada? - continuou Francesca.
- Sim, senhora. Meu pai estava muito doente quando chegou o momento
de minha apresentação - explicou Constance - Morreu uns anos depois.
- Ah, entendo - disse Francesca.
Constance olhou a sua acompanhante. Nos olhos de Francesca havia um
olhar de perspicácia que dava a entender que entendia mais coisas do que lhe
tinha contado
Constance. Que entendia o passar lento do tempo enquanto Constance
cuidava de seu pai, os dias de aborrecimento e tristeza, intercalados com
momentos de trabalho duro e confusão quando sua enfermidade piorara.
- Sinto sua perda - disse Lady Haughston amavelmente. Depois de um
momento, acrescentou - Assim agora vive com seus tios. E sua tia a
amadrinhou. Que bondoso de sua parte.
Constance notou que lhe ruborizavam as faces. Não podia negar aquelas
palavras, porque teria sido um detalhe ingrato, mas tampouco era capaz de
dar a entender que sua tia atuava por bondade. Assim, limitou-se a dizer:
- Sim. Bom, suas filhas já têm idade para debutar, e...
- Estou certa de que é uma grande ajuda para ela - disse Lady Haughston.
Constance a olhou de novo e teve que sorrir. Lady Haughston não era tola;
entendia muito bem por que a tia Blanche tinha levado a Constance a Londres:
não por bem-estar de sua sobrinha, mas sim por seu próprio benefício. Embora
Constance se perguntava qual seria o propósito da dama, sentia-se a gosto
com ela sem poder evitá-lo. Lady Haughston tinha uma calides de trato pouco
comum entre a maioria dos membros da aristocracia.
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-Mesmo assim - continuou Lady Haughston -, deve ter tempo para
conhecer Londres, também.
- Visitei alguns dos museus -respondeu Constance - Gostei muito.
- Seriamente? Bom, isso é excelente, mas eu estava pensando em algo
mais parecido A... digamos que a ir às compras.
- De compras? - repetiu Constance, que acabava de alcançar o máximo
ponto de confusão-. Comprar o que, senhora?
- Bom, eu nunca limito a uma só coisa - respondeu Lady Haughston com
um sorriso de felino satisfeito - Isso seria muito aborrecido. Sempre saio com a
idéia de explorar e procurar o que houver por aí. Possivelmente poderia me
acompanhar amanhã.
Constance a olhou com verdadeiro assombro.
- Desculpe?
- Me acompanhar às lojas - repetiu a dama com uma suave gargalhada -
Não deve me olhar assim. Prometo que não será nada horrível.
-Eu... sinto-o - disse Constance, ruborizando-se de novo - Deve acreditar
que sou uma boba. O que ocorre é que seu oferecimento me tomou de
surpresa. De fato, eu gostaria muito de ir com você, embora ache que devo lhe
dizer que me dou muito mal com as compras.
- Não têm que se preocupar. - respondeu Lady Haughston com os olhos
brilhantes. - Asseguro que sou bastante perita para comprar pelas duas.
Constance sorriu. Não sabia com exatidão o que estava ocorrendo, mas a
expectativa de passar um dia inteiro longe de sua tia e suas primas era
deliciosa. E Constance era humana, assim não pôde evitar sentir certa
satisfação perversa ao pensar na cara que poria sua tia quando soubesse que
Constance tinha sido escolhida por uma das mulheres mais aristocráticas e
conhecidas de Londres.
- Então, decidido - continuou Lady Haughston - Passarei para buscá-la
amanhã, digamos que à uma, e iremos às compras.
- É muito amável.
Francesca sorriu e apertou a mão a Constance para despedir-se. Depois,
partiu.
Constance observou como se afastava, sem entender por que Lady
Haughston estava interessada nela. Entretanto, pensou que poderia ser
interessante averiguá-lo. Voltou-se e olhou para o lugar no qual tinham ficado
seus tios e suas primas, e os divisou entre a multidão. Então pensou que sua
tia não saberia exatamente em que momento se separaram Lady Haughston e
ela. Possivelmente pudesse passar um pouco mais de tempo afastada deles
sem expor-se à censura da tia Blanche.
Constance olhou a seu redor e viu uma porta que se abria ao corredor.
Avançou entre as pessoas e a atravessou. Depois de percorrer aquele corredor,
descobriu outro mais estreito, e nele, uma porta dupla e parcialmente aberta.
Constance se deu conta de que era uma biblioteca. Com um sorriso nos lábios,
entrou. Era uma grande biblioteca, com efeito, com estantes repletas de livros
que chegavam até o teto e que cobriam as quatro paredes salvo nos lugares
ocupados pelas janelas muito altas. E, suspirando de puro prazer, ficou a
contemplar os volumes que ocupavam as estantes.
Seu pai tinha sido um homem culto, muito mais disposto a colocar o nariz
entre as páginas de um livro que a ocupar-se da contabilidade de sua
propriedade. A biblioteca de sua casa também tinha estado cheia de livros de
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todos os tamanhos e assuntos, mas aquele lugar era muito menor, e não podia
conter nem um terço dos livros que havia ali.
Constance passeou pelas estantes da parede oposta à porta, e estava
lendo os títulos quando ouviu uns passos apressados que se aproximavam pelo
corredor. Um momento depois, um homem irrompeu no aposento com uma
expressão de angústia.
Olhou a seu redor durante uns instantes e se fixou em Constance, que se
tinha ficado muito surpreendida.
Ele pôs um dedo sobre os lábios para lhe indicar que guardasse silêncio e
se escondeu atrás da porta.
Capítulo 2
Constance, perplexa, não soube como reagir. Dirigiu-se para a saída da
biblioteca, mas naquele mesmo momento apareceu uma mulher de baixa
estatura, gordinha, vestida com um traje rosa de cetim muito pouco
favorecedor. A mulher olhou acusadoramente a Constance e lhe espetou:
- Viu o visconde?
- Aqui? Na biblioteca? - perguntou-lhe Constance, arqueando as
sobrancelhas.
A outra mulher se mostrou cética.
- Parece algo improvável - admitiu. Depois olhou a ambos os lados do
corredor e ao interior da biblioteca - Mas estou segura de que vi Lorde Leighton
entrar aqui.
- Havia um homem correndo pelo corredor há um momento - disse
Constance - Provavelmente entrou no corredor principal.
A mulher entrecerrou os olhos.
- Certamente foi ao salão de fumantes.
Voltou-se e, apressadamente, continuou com sua perseguição. Quando o
som de seus passos sossegou, o homem saiu de detrás da porta e deixou
escapar um suspiro de alívio.
- Querida senhora, estar-lhe-ei eternamente agradecido - disse a
Constance com um encantador sorriso.
A Constance também lhe escapou um sorriso. Era um homem muito
bonito, e tinha maneiras muito agradáveis. Era mais alto que a média, e
esbelto, com um corpo musculoso que insinuava uma força física considerável.
Estava vestido com elegância; levava um traje negro e uma camisa branca, e
um lenço atado ao pescoço, sofisticado, mas sem os adornos e babados de um
dandi. Tinha os olhos muito azuis, e a boca ampla e expressiva. Quando sorria,
como naquele momento, se formava uma covinha na face e lhe brilhavam os
olhos, sinais que certamente conseguiriam que todo mundo se unisse a seu
bom humor. Tinha o cabelo loiro escuro, com mechas mais claras, e um pouco
mais longo do que seria aconselhável pela moda reinante.
Pareceu a Constance uma pessoa muito atraente e encantadora, e pensou
que, certamente, ele conhecia o efeito que produzia aos outros, sobre tudo as
mulheres. Ela sentiu uma atração visceral, coisa que demonstrava o poder
daquele homem, pensou, e decididamente, tentou controlar os nervos que
atendiam o estômago. Tinha que ser imune aos sorrisos de paquera que
pudessem lhe dirigir os homens, porque, depois de tudo, ela não era um bom
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partido para ninguém, e qualquer outra opção era inaceitável.
- Presumo que é o visconde Leighton... - disse-lhe com ligeireza.
- Ah, assim é, para meu castigo -respondeu ele, e lhe fez uma amável
reverencia - E qual é seu nome, senhora?
- Sou senhorita - respondeu ela -, e seria impróprio, parece-me, dizê-lo a
um estranho.
- Ah, mas não tão impróprio como estar a sós com um estranho, como
está agora - replicou ele - Entretanto, uma vez que me disser seu nome, já não
seremos estranhos, e então, tudo será perfeitamente respeitável.
Ela riu ante aquele raciocínio.
- Sou a senhorita Woodley, milord. A senhorita Constance Woodley.
- Senhorita Constance Woodley - repetiu ele - Agora deve me oferecer sua
mão.
- Seriamente? Devo fazê-lo? - perguntou Constance, divertida. Não
recordava quando tinha paquerado pela última vez a um homem, e o achou
muito estimulante.
- Oh, sim - disse ele, gravemente - Porque, se não o fizer, como vou
inclinar-me ante ela?
- Mas se já fez uma perfeita reverência - assinalou Constance.
- Sim, mas não enquanto tinha a grande fortuna de estar em posse de sua
mão - replicou ele.
Constance lhe estendeu a mão, dizendo:
- É um indivíduo muito persistente.
Tomou a mão e se inclinou sobre ela, segurando-a um pouco mais do que
seria adequado. Quando a soltou, sorriu, e Constance sentiu a calidez de seu
sorriso por todo o corpo, até as pontas dos dedos dos pés.
- Agora somos amigos, assim tudo é muito próprio.
- Amigos? Só somos conhecidos - afirmou Constance.
- Ah, mas me salvou de Lady Taffington. Isso a converte em minha amiga.
- Então, como amiga, posso tomar a liberdade de perguntar por que
estava se escondendo de Lady Taffington na biblioteca. Não parecia uma
mulher tão aterradora para afugentar um homem.
- Se diz isso é porque não conhece Lady Taffington. É a mais terrível das
criaturas: uma mãe decidida a casar a sua filha.
- Então, deve tomar cuidado de não tropeçar com minha tia – advertiu
Constance.
Ele riu.
- Temo que estejam por toda parte. A perspectiva de um futuro condado é
mais do que podem resistir.
- Alguns pensariam que não é mal ser tão solicitado.
Ele encolheu os ombros.
- Possivelmente... se a perseguição tivesse algo que ver comigo, e não
com meu título.
Constance suspeitou que solicitavam Lorde Leighton por algo mais que por
seu título. Depois de tudo, era um homem muito bonito e encantador.
Entretanto, pareceu-lhe muito atrevido dizer algo assim.
Como ela ficou em silêncio, ele continuou:
- E para quem tenta sua tia caçar marido? - perguntou a Constance, e
olhou seu dedo sem aliança antes de dizer - Não para você, certamente.
Parece-me que seria uma tarefa muito fácil, se este fosse o caso.
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- Não, não para mim. Eu já passei essa idade - disse, e sorriu um pouco
para suavizar as palavras - Eu só vim ajudar a tia Blanche como dama de
companhia de suas filhas. Estão em sua estréia.
Ele arqueou uma sobrancelha.
- Você? Dama de companhia? - perguntou-lhe, e sorriu também - Espero
que me perdoe o que vou dizer, mas isso é absurdo. Você é muito jovem e
bonita para ser uma dama de companhia. Temo que sua tia se dará conta de
que os pretendentes de suas filhas visitam a casa para ver você.
- E você, senhor, é um adulador - disse Constance, e olhou para a porta –
Devo ir.
- Abandona-me? Vamos, não parta ainda. Certamente suas primas
poderão viver um pouco mais sem seu acompanhamento.
Para falar a verdade, Constance não sentia muito desejo de partir. Era
muito mais divertido conversar com aquele visconde tão bonito que ver como
suas primas falavam e paqueravam. Entretanto, temia que se ficasse muito
tempo, sua tia iria procurá-la, e a última coisa que queria era que a tia Blanche
a encontrasse ali, a sós com um homem estranho.
Além disso, não desejava absolutamente que sua tia conhecesse Lorde
Leighton e se convertesse em uma mais do grupo de senhoras que o
perseguiam para casá-lo com uma de suas filhas.
- Sem dúvida, mas eu estou descuidando de meu dever - respondeu ela, e
lhe estendeu a mão - Adeus, milord.
- Senhorita Woodley - disse ele com um grande sorriso, e tomou a mão –
Me alegrou a noite grandemente.
Constance lhe devolveu o sorriso, sem saber que o fato de desfrutar
daqueles momentos tinha conferido brilho a seus olhos e rubor a suas faces.
Nem sequer a severidade de seu vestido e de seu penteado pôde mascarar seu
atrativo.
Não lhe soltou a mão imediatamente; ficou olhando-a com fixidez, e então,
para surpresa de Constance, inclinou-se para ela e a beijou.
Constance ficou imóvel. Aquele beijo foi algo tão inesperado que ela não
se afastou, e depois de um momento se deu conta de que não queria fazê-lo.
Sentia os lábios daquele homem de uma maneira ligeira e suave, mas o
contato lhe produziu um comichão por todo o corpo. Pensou que ele seria
quem se afastaria, mas, para sua surpresa, tampouco o fez. Em vez disso,
beijou-a cada vez mais profundamente, afundando os lábios nos de Constance,
e com suavidade, inexoravelmente, conseguindo que sua boca se abrisse para
ele. Constance ergueu as mãos por instinto e as apoiou em seu peito.
Sabia que tinha que empurrá-lo com indignação, mas em vez disso,
agarrou-se às lapelas de sua jaqueta e se aferrou ao caudal de sensações que
a embargavam.
Posou a mão na sua cintura, e com a outra lhe segurou a nuca enquanto
seguia beijando-a.
Com sinceridade, Constance se alegrou de que ele a segurasse, porque
tinha a sensação de que iriam falhar lhe os joelhos. Nunca havia se sentido
daquela maneira, nem sequer quando tinha dezenove anos e se apaixonara
por Gareth Hamilton. Gareth a tinha beijado quando lhe tinha pedido que se
casasse com ele, e Constance tinha pensado que nada poderia ser tão doce
como aquele beijo. Tinha lhe sido mais difícil rechaçar a seu pretendente para
poder cuidar de seu pai durante sua enfermidade.
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Entretanto, o abraço de Lorde Leighton não era doce absolutamente; era
forte e exigente. E a estava marcando a fogo com seu beijo. Embora Constance
mal conhecesse aquele homem, estava tremendo e tinha perdido a capacidade
de pensar com clareza.
Ele ergueu a cabeça, e durante um longo momento se olharam o um ao
outro, mais afetados e trêmulos do que teriam querido admitir. Leighton tomou
ar e se separou dela. Constance o olhou com os olhos totalmente abertos,
incapaz de falar.
Depois virou-se e saiu correndo da biblioteca.
Não havia ninguém no corredor, felizmente. Constance não queria
imaginar que aspecto tinha. Se parecesse com o que sentia por dentro, então
estava certa de que todo mundo ficaria olhando-a. O coração lhe pulsava
rapidamente e tinha os nervos à flor da pele.
Constance se aproximou de um dos espelhos que pendia na parede e
contemplou seu reflexo. Tinha os olhos suaves e brilhantes, e as faces e os
lábios avermelhados. Deu-se conta de que estava mais bonita. Seria tão
evidente para que as pessoas soubessem o que tinha feito?
Com as mãos trêmulas, ajeitou o coque. Depois respirou profundamente
várias vezes e tentou acalmar-se e ordenar seus pensamentos.
Por que a teria beijado Lorde Leighton? Acaso não era mais que um
mulherengo, um sedutor que tinha querido aproveitar-se de uma mulher em
uma situação vulnerável?
Constance achava difícil acreditar nisso. Ele tinha sido tão agradável... não
era só um homem bonito, mas tinha um brilho especial no olhar e um grande
senso de humor.
Entretanto, possivelmente os libertinos seriam assim. Aquilo tinha sentido.
Sem dúvida, era muito mais fácil seduzir a alguém sendo encantador.
Entretanto, Constance não podia acreditar algo assim de Lorde Leighton.
Quando se tinha afastado dela, depois de beijá-la, tinha uma expressão de
surpresa no rosto, como se ele tampouco esperasse o que tinha acontecido. E
não tinha tentado seduzi-la depois, embora ela não houvesse posto resistência,
tão centrada estava no beijo.
Claramente, o fato de que ele tivesse interrompido aquele beijo provava
que era muito cavalheiresco para aproveitar-se da situação.
Ele tinha querido beijá-la, é obvio, embora tivesse sido um gesto
impulsivo. Mas Constance recordou como o beijo, que a princípio só tinha sido
um ligeiro toque, tinha se feito mais profundo e apaixonado. Acaso ele só
pretendia lhe dar um beijinho, como uma espécie de travessura, e se tinha
visto apanhado pelo desejo, como ela?
Aquele pensamento fez com que Constance sorrisse. Gostaria de pensar
que ela não tinha sido a única que se vira apanhada pela paixão.
Olhou-se de novo no espelho. Seria possível que o visconde Leighton a
tivesse achado atraente apesar da simplicidade com a qual ia vestida?
Observou seu rosto, de traços regulares e com uma agradável forma oval.
Constance não acreditava que parecesse muito mais velha que vinte anos. E
tinha havido um ou dois homens além do Gareth que, quando era jovem,
haviam-lhe dito que tinha uns formosos olhos e que seu cabelo era muito
brilhante. Teria visto Leighton que além de sua atual falta de brilho havia uma
jovem bonita?
Gostaria que a tivesse visto como uma mulher atraente e desejável, e não
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que tivesse pensado, simplesmente, que era um alvo fácil para suas atenções.
Sem deixar de pensar naquele encontro, Constance percorreu o corredor
de volta ao salão de baile. O aposento continuava abarrotado e o ambiente era
cansativo. Abriu passagem entre as pessoas e voltou com seus tios.
Para sua surpresa, sua tia não lhe reprovou que tivesse passado muito
tempo afastada deles. Em vez disso, dedicou a Constance um sorriso
resplandecente e tomou pelo braço para aproximá-la.
- O que lhe disse? - perguntou sua tia Blanche ansiosamente, inclinando-se
para ela a fim de fazer-se ouvir por cima do ruído. Depois, sem esperar a
resposta de Constance, prosseguiu - Pensar que Lady Haughston se fixou em
nós! Fiquei aniquilada quando Lady Welcombe nos apresentou. Nunca teria
esperado que uma dama tão distinta percebesse nossa existência, e muito
menos que quisesse nos conhecer. O que lhe disse? Como é?
Constance custou um pouco de esforço recordar seu passeio com Lady
Haughston pelo salão. O que tinha ocorrido depois o tinha tirado da cabeça por
completo.
- É muito agradável - disse Constance - Me foi muito simpática.
Perguntou-se se devia dizer a sua tia que Lady Haughston lhe tinha
proposto ir às compras no dia seguinte. Em realidade, a Constance parecia
improvável que a mulher houvesse dito a sério. A conversa tinha sido muito
agradável, mas era absurdo pensar que uma mulher da posição de Lady
Haughston fizesse qualquer esforço por converter-se em sua amiga. Constance
provinha de uma família respeitável, é obvio, cujos antepassados provinham da
família Tudor, mas o título de seu pai tinha sido só de barão, e, além disso, não
tinha uma grande fortuna. Seu pai e ela tinham levado uma vida tranqüila no
campo. De fato, aquela era a primeira vez que Constance visitava Londres.
A tia Blanche lhe fez um sem-fim de perguntas sobre sua conversa com
Lady Haughston e se gabou de tudo o que sua influência podia fazer por
Georgiana e Margaret; entretanto, Constance não tinha notado nenhum
interesse particular em suas primas por parte da dama. De fato, Lady
Haughston tinha requerido a companhia de Constance, embora ela não tivesse
nem a mínima idéia do motivo. Não obstante, Constance não considerou uma
boa idéia fazê-la notar a sua tia.
Assim, não disse nada quando a tia Blanche e as duas moças continuaram
especulando alegremente sobre as vantagens que lhes reportaria o fato de
conhecer Lady Haughston na hora de aumentar seu status, e sobre o que