Efeitos hemodinâmicos sistêmicos e regionais da ressuscitação volêmica com solução salina... por Luciana Rahal Abrahão - Versão HTML
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Luciana Rahal Abrahão
Efeitos hemodinâmicos sistêmicos e regionais da ressuscitação
volêmica com solução salina hipertônica e isoncótica guiada pela
saturação venosa mista de oxigênio em modelo experimental de choque
séptico
Tese apresentada à Faculdade de Medicina
da Universidade de São Paulo para
obtenção do título de Doutor em Ciências
Área de Concentração: Anestesiologia
Orientador: Prof. Dr. Luiz Francisco Poli de
Figueiredo
São Paulo
2008
ORIENTADOR
Prof. Dr. Luiz Francisco Poli de Figueiredo
Professor-Associado do Departamento de Cardio-pneumologia.
Professor Titular da Disciplina de Técnica Cirúrgica e Cirurgia Experimental.
Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
DEDICATÓRIA
À minha mãe Denise, responsável pela minha formação moral e pelo incentivo ao
estudo.
À minha irmã Camilla, pelo apoio, amizade e companheirismo sempre.
AGRADECIMENTOS
Ao Prof. Dr. Maurício Rocha e Silva, pela oportunidade de realizar este projeto junto
à Divisão de Experimentação do Instituto do Coração.
Ao Prof. Dr. Luiz Francisco Poli de Figueiredo, pela orientação na confecção desta
tese e pela dedicação, apoio, paciência, entusiasmo e incentivo ao longo de todo este
projeto.
À Dra Alejandra del Pilar Gallardo Garrido, por todos os ensinamentos, pela
amizade, apoio, estímulo e companheirismo inigualáveis.
Ao Prof. Dr. Ruy Jorge Cruz Jr., exemplo de coragem e perseverança, pelo incentivo
e pelos ensinamentos que enriqueceram este estudo.
À Sra. Eliete Barbosa, diretora; Sr. Nelson Correia Jr., Sra. Leonora Loppnow, Sr.
Dario Ribeiro, e a todos os funcionários da Divisão de Experimentação do Instituto
do Coração, pelo apoio e dedicação na execução deste projeto.
À Sra. Elenice França, pelo estímulo, apoio,carinho e atenção em todos os momentos
da execução deste projeto.
À Sra. Tania Mara Ibelli Vaz, Chefe da Seção de Bacteriologia do Instituto Adolfo
Lutz. À Sra. Kinue Irino, bióloga e pesquisadora e Sra. Maria Idê M. F. Kato,
auxiliar de pesquisa, pela preciosa colaboração com o preparo do inóculo de
bactérias.
Ao Dr. Luis Benvenuti, patologista do Departamento de Patologia do Instituto do
Coração, por realizar a análise histológica.
À Profa. Rejane Mary do Nascimento, pela dedicada revisão deste texto.
À Sra. Júlia Fukushima, pela análise estatística realizada neste estudo.
À minha família e a todos os amigos pelo apoio e compreensão em todos os
momentos desta longa jornada.
A Deus por iluminar os meus passos e me permitir a realização deste sonho.
“Em relação a todos os atos de iniciativa e criação, existe uma verdade fundamental,
cujo desconhecimento mata inúmeras idéias e planos esplêndidos: a de que, no
momento em que nos comprometemos definidamente, a providência move-se também...
...O que quer que você possa fazer ou sonhe que possa, faça-o. Coragem contém
genialidade, poder e magia. Comece-o agora ”
(Goethe)
Esta tese está de acordo com as seguintes normas, em vigor no momento
desta publicação:
Referências: adaptado de International Comitee of Medical Journal Editors
(Vancouver).
Universidade de São Paulo. Faculdade de Medicina. Serviço de Biblioteca e
documentação. Guia de apresentação de dissertações, teses e monografias.
Elaborado por Annelise Carneiro da Cunha, Maria Julia de A.L. Freddi,
Maria F. Crestana, Marinalva de Souza Aragão, Suely Campos
Cardoso,Valéria Vilhena. 2ª ed. São Paulo: Serviço de Biblioteca e
documentação; 2005.
Abreviaturas dos títulos de periódicos de acordo com List of Journals
Indexed in Index Medicus.
SUMÁRIO
Lista de Abreviaturas
Lista de Figuras
Resumo
Summary
1. INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 1
2. OBJETIVOS........................................................................................................... 5
3. REVISÃO DA LITERATURA ............................................................................. 7
4. MÉTODOS ........................................................................................................... 39
4.1 Preparação do inóculo de bactérias................................................................... 40
4.2 Animais de experimentação ............................................................................... 41
4.3 Preparação experimental .................................................................................... 42
4.4 Grupos experimentais ........................................................................................ 46
4.5 Protocolo experimental ...................................................................................... 47
4.6 Variáveis estudadas............................................................................................. 48
4.7 Análise histopatológica ....................................................................................... 54
4.8 Método estatístico ................................................................................................ 56
5. RESULTADOS..................................................................................................... 57
5.1 Volume administrado.......................................................................................... 58
5.2 Peso dos animais ................................................................................................. 60
5.3 Temperatura central ............................................................................................ 60
5.4 Variáveis sistêmicas............................................................................................ 61
5.5 Variáveis regionais.............................................................................................. 85
5.6 Mortalidade ......................................................................................................... 96
5.7 Análise histopatológica ....................................................................................... 96
6. DISCUSSÃO....................................................................................................... 110
7. CONCLUSÕES .................................................................................................. 129
8. ANEXOS ............................................................................................................. 131
9. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS............................................................. 151
LISTA DE ABREVIATURAS
ADP: adenosina difosfato
APACHE II: Acute Phisiology and Chronic Health Evaluation II
ATP: adenosina trifosfato
Bcl-2: célula B linfoma 2
BE: excesso de bases
CaO2: conteúdo de oxigênio arterial
CARS: síndrome da resposta anti-inflamatória
CDC: Center for Diseases Control
cm: centímetros
CO2: gás carbônico
CpO2: conteúdo de oxigênio da veia porta
CT: grupo controle
CvO2: conteúdo de oxigênio venoso misto
DC: débito cardíaco
DMOS: disfunção de múltiplos órgãos e sistemas
DO2: oferta sistêmica de oxigênio
DO2 espl: oferta esplâncnica de oxigênio
E.coli: Escherichia coli
EGDT: Early Goal Directed Therapy
FAH: fluxo da artéria hepática
FiO2: fração inspirada de oxigênio
FVP: fluxo da veia porta
GM-CSF: fator estimulante de colônias de granulócitos e macrófagos
GMPc: guanosina monofosfato cíclico
Hb: hemoglobina
Hba: hemoglobina arterial
Hbp: hemoglobina da veia porta
Hbv: hemoglobina venosa mista
HCO3: bicarbonato
HES: hydroxiethilstarch
HS: grupo tratado com solução salina hipertônica e isoncótica
HSP: heat shock protein
Ht: hematócrito
IAL: Instituto Adolpho Lutz
IAP: proteínas inibidoras de apoptose
IC: índice cardíaco
IFAH: índice de fluxo da artéria hepática
IFHT: índice de fluxo hepático total
IFVP: índice de fluxo da veia porta
IL: interleucina
iNOS: óxido nítrico sintase induzível
IRVP: índice da resistência vascular pulmonar
IRVS: índice da resistência vascular sistêmica
MAPK: mitogen - activated protein kinase
ml: mililitros
MODS: Multiple Organ Dysfunction Score
NK: natural killer
nm: nanômetro
O2: oxigênio
PaCO2: pressão parcial de gás carbônico arterial
PAD: pressão de átrio direito
PAM: pressão arterial média
PaO2: pressão parcial de oxigênio arterial
PARP 1: poli (ADP- ribose) polimerase 1
PC: peso corpóreo
pCO2 : pressão parcial de gás carbônico
PEEP: pressão expiratória final positiva
PG: prostagandina
PMAP: pressão média de artéria pulmonar
pO2: pressão parcial de oxigênio
POAP: pressão de oclusão da artéria pulmonar
PpCO2: pressão parcial de gás carbônico da veia porta
PpO2: pressão parcial de oxigênio da veia porta
PvCO2: pressão parcial de gás carbônico venoso misto
PvO2: pressão parcial de oxigênio venoso misto
SaO2: saturação de oxigênio arterial
SAFE: Saline versus Albumin Fluid Evaluation
SAPS II: Simplified Acute Physiology Score II
SC: superfície corpórea
SF: grupo tratado com solução salina 0,9%
SIRS: Síndrome da resposta inflamatória sistêmica
SOAP: sepsis occurrence in acutely ill patients
SOFA: sequential organ failure assesment
SpO2: saturação de oxigênio da veia porta
SvO2: saturação de oxigênio venoso misto
SvcO2: saturação venosa central de oxigênio
TEpO2: taxa de extração de oxigênio porta
TEsO2: taxa de extração de oxigênio sistêmica
TNF: fator de necrose tumoral
TSA: Trypticase Soy Agar
TSB: Trypticase Soy Broth
TTPa: tempo de tromboplastina parcial ativada
TUNEL: Terminal deoxynucleotidil transferase mediated dUTP-biotin nick end
labeling
ufc: unidade formadora de colônia
VO2: consumo de oxigênio sistêmico
VO2espl: consumo de oxigênio esplâncnico
LISTA DE FIGURAS
Figura pág.
Fig.1. Aparelho de ventilação mecânica
43
Fig. 2. Monitor de débito cardíaco
45
Fig. 3. Transdutores de fluxo
46
Fig. 4. Posicionamento de transdutores de fluxo ao redor dos vasos
46
Fig. 5. Protocolo experimental
48
Fig. 6. Volume total administrado em cada grupo
59
Fig. 7. Volume total administrado em cada experimento
59
Fig. 8. Temperatura central
61
Fig. 9. Pressão arterial média
62
Fig. 10. Pressão média de artéria pulmonar
63
Fig. 11. Pressão de oclusão da artéria pulmonar
65
Fig. 12. Pressão de átrio direito
65
Fig. 13. Índice cardíaco
67
Fig. 14. Índice de resistência vascular sistêmica
68
Fig. 15. Índice de resistência vascular pulmonar
69
Fig. 16. Oferta de oxigênio sistêmica
70
Fig. 17. Consumo de oxigênio sistêmico
71
Fig. 18. Taxa de extração de oxigênio sistêmica
72
Fig. 19. Saturação de oxigênio venosa mista
74
Fig. 20. pH arterial
75
Fig. 21. Bicarbonato de sódio arterial
76
Figura pág.
Fig. 22. Hemoglobina arterial
77
Fig. 23. Lactato arterial
78
Fig. 24. Sódio arterial
80
Fig. 25. Glicose arterial
81
Fig. 26. CO2 arterial
82
Fig. 27. Relação PaO2/FiO2 arterial
83
Fig. 28. Gradiente veno-arterial de CO2
84
Fig. 29. Índice de fluxo da veia porta
85
Fig. 30. Índice de fluxo da artéria hepática
86
Fig. 31. Índice de fluxo hepático total
88
Fig. 32. Saturação de oxigênio da veia porta
89
Fig. 33. Lactato da veia porta
90
Fig. 34. Glicose da veia porta
91
Fig. 35. Oferta esplâncnica de oxigênio
92
Fig. 36. Consumo esplâncnico de oxigênio
93
Fig. 37. Taxa de extração de oxigênio da veia porta
95
Fig. 38. Gradiente porta-arterial de CO2
96
Fig. 39. Fígado. Coloração pela hematoxilina-eosina (grupo HS)
100
Fig. 40. Fígado. Coloração pela hematoxilina-eosina (grupo CT)
100
Fig. 41. Fígado. Coloração pela hematoxilina-eosina (grupo SF)
101
Fig. 42. Intestino. Coloração pela hematoxilina-eosina (grupo CT)
101
Fig. 43. Intestino. Coloração pela hematoxilina-eosina (grupo HS)
102
Fig. 44. Intestino. Coloração pela hematoxilina-eosina (grupo SF)
102
Figura pág.
Fig. 45. Miocárdio. Coloração pela hematoxilina-eosina (grupo SF)
103
Fig. 46. Rim. Coloração pela hematoxilina-eosina (grupo HS)
103
Fig. 47. Pulmão. Coloração pela hematoxilina-eosina (grupo CT)
104
Fig. 48. Semi quantificação da apoptose em fragmentos de fígado
105
Fig. 49. Apoptose pela técnica do TUNEL no fígado (grupo CT)
105
Fig. 50. Apoptose pela técnica do TUNEL no fígado (grupo SF)
106
Fig. 51. Apoptose pela técnica do TUNEL no fígado (grupo HS)
106
Fig. 52. Semi quantificação da apoptose em fragmentos de intestino
107
Fig. 53. Apoptose pela técnica do TUNEL no intestino (grupo CT)
108
Fig. 54. Apoptose pela técnica do TUNEL no intestino (grupo SF)
108
Fig. 55. Apoptose pela técnica do TUNEL no intestino (grupo HS)
109
Resumo
Abrahão, L.R. Efeitos hemodinâmicos sistêmicos e regionais da ressuscitação
volêmica com solução salina hipertônica e isoncótica guiada pela saturação venosa
mista de oxigênio em modelo experimental de choque séptico. São Paulo. 2008. 160
pgs. Tese (Doutorado). Faculdade de Medicina, Universidade de São Paulo.
Introdução: A disfunção de múltiplos órgãos induzida pela sepse é a principal causa
de morte em Unidades de Terapia Intensiva. Complexas anormalidades
hemodinâmicas, microcirculatórias e do metabolismo promovem dano tecidual e
disfunção orgânica. Em particular, no território esplâncnico, os distúrbios da
perfusão são precoces, desproporcionais ao comprometimento sistêmico e persistem
apesar de uma ressuscitação sistêmica adequada, contribuindo para a disfunção de
múltiplos órgãos. A reposição volêmica, fundamental no manejo inicial do choque
séptico, é mais eficaz quando guiada por metas derivadas de oxigenação. Objetivo:
avaliar os efeitos hemodinâmicos sistêmicos e regionais da ressuscitação volêmica
guiada pela saturação venosa mista de oxigênio e avaliar se a utilização de uma
solução isooncótica e hipertônica (poli O-2 hidroxietil amido a 6% e cloreto de sódio
7,2%, Hyper Haes®) promove benefícios adicionais à ressuscitação com cristalóides
em modelo experimental de choque séptico induzido pela infusão de cepas vivas de
E.coli. Método: Dezessete cães anestesiados e ventilados mecanicamente foram
monitorados com cateterização da aorta abdominal e com cateter de artéria
pulmonar. Após esplenectomia, foi cateterizada a veia porta e foram posicionados
transdutores ultrasônicos de fluxo ao redor da veia porta e artéria hepática. O lactato
e as variáveis de oxigenação foram obtidos a partir de amostras de sangue arterial,
venoso misto e porta. Os animais foram randomizados em três grupos: Controle,
n=3: E. coli 1,2 x1010ufc/kg em 30 minutos; sem intervenções adicionais; SF n=7:
E. coli 1,2 x1010ufc/kg em 30 minutos + reposição volêmica inicial com SF 0,9%
32ml/kg, HS, n=7: E. coli 1,2x1010ufc/kg em 30 minutos + reposição volêmica
inicial com Hyper Haes® 4ml/kg. Se após 30 e 60 minutos, SvO2 < 70%, reposições
adicionais com SF 0,9% 32ml/kg eram realizadas em ambos os grupos.
Posteriormente, os animais foram observados por 90 minutos e então sacrificados.
Resultados: Após a inoculação de bactérias, houve redução de 20% do índice
cardíaco, 15% da pressão arterial média e queda de 50% dos fluxos regionais com
recuperação parcial e transitória após a ressuscitação volêmica. Observamos aumento
progressivo das taxas de extração de oxigênio sistêmica e porta e dos gradientes
veno-arterial e porta-arterial de CO2 nos três grupos. Embora os benefícios
hemodinâmicos sistêmicos e regionais tenham sido parciais e transitórios nos dois
grupos, o grupo tratado com Hyper Haes® apresentou menor grau de apoptose de
células do epitélio intestinal. Conclusões: A ressuscitação volêmica guiada pela
saturação venosa mista de oxigênio promoveu benefícios hemodinâmicos sistêmicos
e regionais parciais e transitórios insuficientes para a restauração da perfusão
sistêmica e regional neste modelo experimental de choque séptico hipodinâmico. A
utilização de uma pequena quantidade de solução salina hipertônica e isoncótica
promoveu benefícios hemodinâmicos sistêmicos e regionais semelhantes à
ressuscitação volêmica com grandes volumes de cristalóides neste modelo de choque
séptico hipodinâmico. Entretanto, observamos um menor grau de apoptose de células
do epitélio intestinal no grupo tratado com solução salina hipertônica e isoncótica.
descritores: choque séptico, Escherichia coli, mucosa intestinal, soluções
hipertônicas, apoptose, cães.
Summary
Abrahão, L.R. Systemic and regional hemodynamic effects of fluid resuscitation
with a hypertonic isoncotic solution guided by mixed venous oxygen saturation in
experimental model of septic shock. São Paulo. 2008. 160 pgs. Tese (Doutorado).
Faculdade de Medicina, Universidade de São Paulo.
Introduction: Sepsis related multiple organ failure is the leading cause of death in
intensive care units. Complex hemodynamic abnormalities and microcirculatory and
cellular alterations promote tissue damage and organ dysfunction. Moreover,
splanchnic perfusion is prone to early injury and is compromised in a larger extent
than systemic perfusion and persists despite normalization of systemic hemodynamic
and oxygen derived variables leading to multiple organ dysfunction. Volume
replacement is essential in the management of septic shock and is more efficient
when guided by oxigenation endpoints. Objectives: evaluate systemic and regional
effects of resuscitation guided by mixed venous oxygen saturation and evaluate if a
hypertonic isoncotic solution (poli O-2 hydroxyl ethyl amid 6% and NaCl 7.2%,
Hyper Haes®) would improve the benefits of crystalloid resuscitation in
experimental septic shock induced by live E.coli infusion. Methods: Seventeen dogs
were anesthetized and mechanically ventilated; they were monitored with aorta and
pulmonary artery catheterization. After splenectomy, portal vein was canullated.
Ultrasonic flow probes were placed around portal vein and hepatic artery. Blood
gases and lactate levels were obtained from arterial, mixed venous and portal vein
samples. Animals were randomized into three groups: Control, n=3 : E. coli 1,2
x1010cfu/kg in 30 minutes; no additional interventions; NS n=7: E. coli 1,2
x1010cfu/kg in 30 minutes + initial fluid replacement with normal saline 32ml/kg, if
after 30 and 60 minutes, SvO2 was below 70%, additional replacement with normal
saline 32ml/kg was performed; HS, n=7: E. coli 1,2x1010cfu/kg in 30 minutes +
initial fluid replacement with Hyper Haes® 4ml/kg, if after 30 and 60 minutes, SvO2
was below 70%, additional replacement with normal saline 32 ml/kg was performed.
Animals were observed for 90 minutes and than were euthanized. Results: After
bacterial infusion, decreases of cardiac index (20%) mean arterial blood pressure
(15%), and regional blood flows (50%) were observed. Both solutions promoted
similar and transient benefits at systemic and regional levels. We also observed
increases in systemic and portal oxygen extraction rates and veno-arterial and portal-
arterial pCO2 gradients in all groups. A lesser degree of gut epithelial cells apoptosis
was observed in Hyper Haes® treated group. Conclusions: Normalization of mixed
venous oxygen saturation was not able to restore splanchnic perfusion markers or
other systemic perfusion variables. Although both solutions promoted similar, partial
and transient benefits at systemic and regional levels in this experimental model of
hypodynamic septic shock hypertonic saline administration was associated with a
decrease in gut epithelial cells apoptosis.
descriptors: septic shock, Escherichia coli, intestinal mucosa, hypertonic solutions,
apoptosis, dogs.
INTRODUÇÃO
Introdução
2
1. Introdução
Sepse é definida como a resposta inflamatória sistêmica desencadeada por um
agente infeccioso ou mediadores por ele induzidos e se caracteriza por uma
complexa interação entre vasodilatação, hipovolemia absoluta ou relativa, disfunção
miocárdica e distribuição irregular do fluxo com comprometimento da perfusão
tecidual, resultando em diferentes graus de disfunção orgânica (Hollemberg et al,
1999). Este espectro de gravidade clínica e fisiopatológica é acompanhado de
progressivas e elevadas morbidade e mortalidade (Matot e Sprung, 2001; Silva et al,
2004).
O trato gastrointestinal, por apresentar fisiologicamente uma baixa tensão de
oxigênio e elevada taxa metabólica em sua extensa camada mucosa, é mais vulnerável
à diminuição da oferta de oxigênio gerada pela redistribuição de fluxo intra e extra
órgãos nas condições de choque. Considerando que a perfusão esplâncnica é
precocemente afetada e sua restauração é tardia após a ressuscitação volêmica
adequada, as alterações celulares induzidas pela hipoperfusão no território
microcirculatório são os fatores desencadeantes e perpetuadores da resposta
inflamatória sistêmica e falência de múltiplos órgãos com liberação maciça de
citocinas e outros mediadores inflamatórios (Ackland et al, 2000; Jakob, 2002; Poli de
Figueiredo et al, 2002; Garrido et al, 2005).
Apesar da importância atribuída à expansão volêmica no manejo de pacientes
com sepse e choque séptico, recomendações a respeito do tipo de fluido, quantidade,
velocidade e tempo de infusão e metas a serem atingidas durante a ressuscitação ainda
são controversas (Hollenberg et al, 1999).
Introdução
3
A solução salina hipertônica possui características que podem ser
interessantes na ressuscitação volêmica inicial do choque séptico. Estudos clínicos e
experimentais, utilizando pequenas doses de solução salina hipertônica,
demonstraram uma rápida expansão plasmática por movimentação do fluido do
intracelular para o extracelular e efeitos hemodinâmicos imediatos com elevação da
pressão arterial e do débito cardíaco. Houve também melhora da perfusão regional
com aumento dos fluxos mesentérico, coronário e renal (de Felippe et al, 1980;
Velasco et al, 1980; Rocha e Silva et al, 1986; 1987) e melhora da função miocárdica
(Ing et al, 1994).
Outro potencial benefício da solução salina hipertônica é sua ação
imunomoduladora e antiinflamatória. Um grande número de estudos demonstrou que
a ressuscitação com solução salina hipertônica pode prevenir a sepse pós-trauma,
modulando a disfunção imunológica, resposta inflamatória e apoptose presentes em
condições de choque e sepse (Coimbra et al, 1996; 1997; Shukla et al, 2004).
Em condições de choque e sepse, existe também um aumento da viscosidade
sanguínea e da resistência hidráulica por edema das hemácias e das células endoteliais
gerando diminuição do fluxo em nível capilar. Pequenas quantidades de solução
salina hipertônica corrigem rapidamente estas alterações (Pascual et al, 2003).
Em estudo realizado em nosso laboratório, o uso de solução salina a 7,5% em
ratos submetidos a choque hemorrágico, evitou a translocação bacteriana e a
infiltração neutrofilica pulmonar, benefício atribuído à menor interação leucócito-
endotélio (Yada Langui et al, 2000; 2004).
Recentemente, em nosso laboratório, em modelo experimental de choque
séptico hipodinâmico em cães, doses letais de Escherichia coli vivas injetadas na
Introdução
4
corrente sanguínea produziram deterioração cardiovascular com hipotensão grave e
queda do débito cardíaco, hipoperfusão esplâncnica e alterações metabólicas
importantes. Neste modelo, a administração de uma pequena dose de solução salina
hipertônica no início da ressuscitação volêmica promoveu benefícios hemodinâmicos
semelhantes à ressuscitação com grandes volumes de cristalóides, porém com
redução das taxas de extração sistêmica e mesentérica de oxigênio sem piora de
outros marcadores de perfusão (Garrido et al, 2006).
Tendo em vista que na sepse a distribuição de fluxo irregular e hipóxia tecidual
persistem mesmo após a normalização de sinais vitais, pressão venosa central e débito
urinário, tem sido recomendado que a ressuscitação volêmica seja guiada através de
variáveis de oxigenação tecidual como lactato arterial, saturação venosa central e pH
(Rivers et al, 2001; Dellinger et al, 2004; Hollenberg et al, 2004).
No presente estudo, utilizando um modelo semelhante ao utilizado por Garrido
et al, testamos a eficácia da ressuscitação volêmica guiada pela saturação venosa
mista de oxigênio. Ainda testamos a hipótese de que a utilização de pequenas
quantidades de solução salina hipertônica isoncótica (poli O-2 hidroxietil amido a
6% + cloreto de sódio 7,2% - Hyper- Haes®) na ressuscitação volêmica inicial
promove benefícios adicionais à ressuscitação com cristalóides.
OBJETIVOS
Objetivos
6
2. Objetivos
• Avaliar os efeitos hemodinâmicos sistêmicos e regionais da
ressuscitação volêmica guiada pela saturação venosa mista de oxigênio
em modelo experimental de choque séptico hipodinâmico induzido pela
infusão endovenosa de dose letal de Escherichia coli.
• Testar a hipótese de que a ressuscitação volêmica inicial com uma
pequena quantidade de solução salina hipertônica e isoncótica (poli (O-2
hidroxietil) amido 6% + cloreto de sódio 7,2%, Hyper-Haes®) promove
benefícios adicionais à ressuscitação volêmica com cristalóides neste
modelo experimental de choque séptico hipodinâmico.
REVISÃO DA LITERATURA
Revisão da literatura
8
3. Revisão da literatura
3.1 Epidemiologia
A sepse e o choque séptico representam um espectro de gravidade clínica e
fisiopatológica acompanhada de progressiva e elevada mortalidade caracterizada pela
resposta inflamatória a um determinado agente infeccioso levando a resposta
inflamatória sistêmica e disfunção ou falência de múltiplos órgãos (Matot e Sprung,
2001).
Os dados a respeito da mortalidade em pacientes sépticos são conflitantes em
grande parte pela falta de consenso em relação à nomenclatura utilizada. Em 1991, o
American College of Chest Physicians e a Society of Critical Care Medicine
estabeleceram um conjunto de definições para os diversos estágios da sepse,
incluindo bacteremia, sepse, sepse grave, choque séptico e disfunção de múltiplos
órgãos (Matot e Sprung, 2001).
Também foi proposto o termo síndrome da resposta inflamatória sistêmica
(SIRS), utilizado para descrever a resposta inflamatória generalizada presente em
diversas condições como pancreatite, trauma e queimaduras. A SIRS se caracteriza
pela alteração de dois ou mais dos seguintes critérios: temperatura, freqüência
cardíaca, freqüência respiratória e contagem de leucócitos. O termo sepse é reservado
aos pacientes com SIRS e infecção documentada (Matot e Sprung, 2001; Rivers et al,
2005).
A sepse é a décima causa de morte nos Estados Unidos (Vincent et al, 2002) e a
principal causa de morte em unidades de terapia intensiva. Sua incidência e
mortalidade persistem elevadas devido ao tratamento agressivo de pacientes com
Revisão da literatura
9
doenças crônicas em estágio avançado, envelhecimento da população e aumento da
prevalência de infecções pelo vírus HIV (Matot e Sprung 2001; Angus et al, 2001;
Vincent et al, 2002; Sessler e Shepherd, 2002).
Sepse grave e choque séptico representam 2,9% das causas de admissão
hospitalar e 10% das admissões em unidades de terapia intensiva. A mortalidade
associada a estas duas condições é maior do que 30% (Rivers et al, 2005). A
precocidade no diagnóstico e tratamento pode modificar sua evolução (Dellinger et
al, 2004).
Em 1990, a estimativa do CDC ( Center for Diseases Control) era de 450.000
casos de sepse por ano nos Estados Unidos com mais de 100.000 óbitos. Um estudo
realizado em 1995 com a população de sete estados norte-americanos mostrou uma
incidência de 751.000 casos por ano e mortalidade hospitalar de 215.000 pacientes
(Angus et al, 2001; Vincent et al, 2002; Sessler e Shepherd, 2002). É importante
ressaltar que este número pode estar subestimado uma vez que muitos destes
pacientes têm comorbidades que são consideradas a causa do óbito (Vincent et al,
2002).
Dados de um estudo brasileiro de 2002, incluindo 1383 pacientes admitidos em
unidades de terapia intensiva, mostram uma incidência de sepse, sepse grave e
choque séptico de 61,4, 35,6 e 30/ 1000 pacientes / dia respectivamente. A
mortalidade dos pacientes com SIRS, sepse, sepse grave e choque séptico aumentou
progressivamente de 24,3% para 34,7%, 47,3% e 52,2% corroborando dados de
estudos realizados em outros países (Silva et al, 2004).
Revisão da literatura
10
3.2 Fisiopatologia
O choque séptico se caracteriza por diminuição da resistência vascular
sistêmica, hipovolemia absoluta e relativa (vasodilatação e aumento da
permeabilidade capilar) disfunção miocárdica e distribuição irregular do fluxo e é
induzido por agentes infecciosos ou mediadores inflamatórios liberados em
decorrência de infecções, resultando em comprometimento da perfusão tecidual
(Hollenberg et al, 1999; 2004; Sessler e Sheperd, 2002; Beale et al, 2004). Mesmo
após uma ressuscitação volêmica adequada, a distribuição irregular do débito
cardíaco normal ou até mesmo elevado persiste devido à disfunção microcirculatória.
(Beale et al, 2004). Pesquisas recentes apontam para a importância de fatores
genéticos, resposta inflamatória do hospedeiro à infecção, alterações da fibrinólise e
da coagulação e disfunção cardiovascular, na fisiopatologia da sepse (Sessler e
Sheperd, 2002).
Numerosos e complexos mecanismos são responsáveis pelas alterações
observadas no choque séptico. A resposta inicial do hospedeiro envolve o sistema
imune humoral e celular e a ativação neuroendócrina diante do estímulo (Rivers et al,
2005).
A função da microcirculação é assegurar a oferta de oxigênio e remoção de
escórias e metabólitos dos tecidos. Em condições fisiológicas a microcirculação tem
a capacidade de se adaptar de acordo com a demanda metabólica. Os mecanismos
envolvidos na regulação da microcirculação são classificados em miogênicos,
metabólicos e neurohumoral. Este sistema depende de interações autócrinas e
parácrinas para regular o fluxo capilar de acordo com a demanda de oxigênio
tecidual. As células endoteliais que revestem os capilares têm papel fundamental na
Revisão da literatura
11
regulação do fluxo através de respostas às alterações de fluxo, alterações metabólicas
e outras substâncias capazes de interferir no tônus e recrutamento capilar (Ince,
2005).
A disfunção microcirculatória é característica na fisiopatologia da sepse
diferentemente do choque hemorrágico ou hipovolêmico, em que a microcirculação
mantém sua capacidade de adaptação diante da diminuição de fluxo e oferta de
oxigênio aos tecidos (Ellis et al, 2005). Esta manifestação é precoce e é associada à
perda da deformabilidade das hemácias e aumento da produção de óxido nítrico. A
heterogeneidade da distribuição do fluxo na microcirculação gera um desequilíbrio
local entre a oferta e demanda de oxigênio, contribuindo para a diminuição da
extração de oxigênio e conseqüentemente disfunção de múltiplos órgãos (Bateman et
al, 2003; Ellis et al, 2005; Ince, 2005).
Embora existam capilares com aumento do fluxo enquanto outros apresentam
redução de fluxo, a formação de “shunts” arteriovenosos impede uma adequada
oferta de oxigênio (Ellis et al, 2005; Ince, 2005). Estudos clínicos e experimentais
demonstram que a ressuscitação volêmica não é capaz de corrigir a disfunção
microcirculatória nem mesmo com a adequação da oferta de oxigênio (Bateman et al,
2003; Ellis et al, 2005). Níveis elevados de lactato e acidose demonstram a
persistência da disfunção microcirculatória apesar da restauração de variáveis
hemodinâmicas e derivadas de oxigênio sistêmicas (Ince 2005).
O endotélio tem importante papel na modulação da resposta inflamatória,
disfunção e morte celular. A ativação endotelial é integrada à ativação de neutrófilos
e plaquetas através da liberação de micropartículas e expressão de moléculas de
adesão (Sessler e Shepherd, 2002; Bateman et al, 2003; Rivers et al, 2005). A
Revisão da literatura
12
interação do endotélio com estes mediadores e produtos inflamatórios é amplificada
quando o sistema complemento e fatores da coagulação são ativados. A perda da
regulação do tônus vascular associada à formação de microtrombos prejudica o fluxo
na microcirculação conduzindo à isquemia, hipóxia e prejuízo do metabolismo
aeróbio (Rivers et al, 2005; Ellis et al, 2005). O aumento da permeabilidade vascular
é dependente em parte da geração de radicais livres de oxigênio. É importante
ressaltar que outros insultos como trauma e choque hemorrágico também produzem
ativação endotelial, mas em menor intensidade do que se constata na sepse (Sessler e
Shepherd, 2002).
Na sepse observamos também alterações de coagulação com aumento dos níveis
circulantes de fator tecidual e inibidor do ativador do plasminogênio tecidual além da
diminuição dos níveis de proteína C e de antitrombina III (Sessler e Shepherd, 2002;
Ellis, et al, 2005).
A vasodilatação característica do choque séptico é acompanhada da diminuição
da resposta às catecolaminas endógenas e exógenas. Os mecanismos envolvidos na
vasodilatação incluem ativação de canais de adenosina trifosfato (ATP) na
membrana, ativação da óxido nitríco sintase induzível (iNOS) e deficiência de
vasopressina. Os dois primeiros mecanismos têm seu efeito vasodilatador por reduzir
o cálcio citoplasmático e aumentar o guanosino monofosfato cíclico (GMP cíclico)
diminuindo a fosforilação da miosina e produzindo vasodilatação (Sessler e
Shepherd, 2002; Bateman et al, 2003; Ince, 2005).
A disfunção celular na sepse é o evento final de múltiplos estímulos entre os
quais se destacam: isquemia, alterações do metabolismo celular por ação de
Revisão da literatura
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mediadores inflamatórios e radicais livres e ativação de caspases conduzindo a
apoptose celular (Hollenberg et al, 1999; 2004).
A hipóxia citopática é uma condição em que existe dano mitocondrial
impedindo o metabolismo aeróbio mesmo quando a oferta de oxigênio é adequada. A
ativação da enzima poli (ADP-ribose) polimerase 1 (PARP1) é fundamental na
patogênese da hipóxia citopática (Fink, 2002). Estudos em modelos experimentais de
sepse medindo a pressão parcial de oxigênio (pO2) tecidual demonstraram que nestas
condições a pO2 encontrava-se normal ou até mesmo elevada, sugerindo diminuição
da utilização de oxigênio (Fink, 2002).
Fisiologia da circulação esplâncnica
O intenso comprometimento da perfusão esplâncnica, particularmente da
mucosa intestinal, tem sido implicado na gênese, amplificação e perpetuação da
resposta inflamatória sistêmica e progressão para disfunção de múltiplos órgãos. A
base fisiopatológica que explica este fenômeno é que a isquemia ou hipóxia intestinal
contribuem para a disfunção da barreira gastrointestinal e translocação de bactérias,
seus subprodutos e citocinas (Ackland et al, 2000; Jakob et al, 2002; Asfar et al,
2004; Garrido et al, 2005). Este mecanismo é freqüentemente denominado de
“motor” da sepse e disfunção de múltilplos órgãos (Beale et al, 2004).
A circulação esplâncnica é suscetível às alterações de fluxo e oxigenação por
diversos motivos. Em condições normais, a mucosa intestinal recebe a maior parte do
fluxo sanguíneo intestinal. Entretanto, na sepse existe uma redistribuição do fluxo
para as camadas serosa e muscular, resultando em hipóxia da camada mucosa. Nestas
condições, reduções no fluxo para o território esplâncnico têm uma repercussão
Revisão da literatura
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ainda maior na oxigenação. Além disso, o intestino apresenta uma DO2 crítica mais
elevada que os outros órgãos. Ainda, a irrigação do vilo intestinal, constituída por
uma arteríola central e duas vênulas, gera um fluxo em contra corrente e um
gradiente de oxigenação entre a base e a extremidade do vilo, tornando esta última
mais suscetível às alterações de fluxo e oxigenação regionais (Beale et al, 2004;
Asfar et al, 2004). Durante a sepse ocorre também vasoconstrição da arteríola e dos
capilares do vilo intestinal deixando-o ainda mais sensível a reduções de fluxo (Beale
et al, 2004).
A circulação hepatoesplâncnica recebe 30% do débito cardíaco. O intestino é
irrigado pelo tronco celíaco e artérias mesentéricas e sua drenagem ocorre através do
sistema porta (Asfar et al, 2004). A circulação mesentérica irriga as camadas
muscular, submucosa e mucosa dispostas em paralelo. As arteríolas regulam o fluxo
para o território esplâncnico e possuem um mecanismo de auto-regulação que
permite uma compensação parcial de diminuições do fluxo. O tônus destes vasos é
resultado do equilíbrio entre a vasoconstrição mediada pelo sistema nervoso
simpático, da inervação colinérgica, da ação de substâncias vasodilatadoras locais e
agentes derivados do endotélio (Ackland et al, 2000).
O consumo de oxigênio esplâncnico representa 20 a 35% do consumo de
oxigênio sistêmico e por meio do aumento da taxa de extração é possível manter o
consumo de oxigênio mesmo em condições de diminuição do fluxo por meio de
mecanismos de adaptação da microcirculação que aumentam o fluxo nas redes
capilares colaterais durante períodos de diminuição na oferta de oxigênio. Estes
mecanismos garantem a integridade da barreira mucosa. Apenas quando há redução
Revisão da literatura
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do consumo de oxigênio para níveis inferiores a 50% do basal, existe perda da
integridade da mucosa (Ackland et al, 2000).
A perfusão esplâncnica é gravemente afetada por diferentes mecanismos nos
diversos tipos de choque. Em condições de hipovolemia ou choque cardiogênico,
existe hipoperfusão esplâncnica, porém as alterações no consumo de oxigênio
esplâncnico são mais tardias. Com a redistribuição de fluxo mediada pelo sistema
nervoso simpático, ocorre vasoconstrição esplâncnica e redistribuição de fluxo para
os órgãos vitais. A utilização da tonometria gástrica em voluntários sadios
submetidos a um curto período de hipovolemia demonstrou queda no pHi durante a
hipovolemia embora as variáveis hemodinâmicas sistêmicas como freqüência
cardíaca, pressão arterial e perfusão periférica se mantivessem normais após uma
perda de 20 a 25% do volume sanguíneo total. Observou-se também que a
vasoconstrição esplâncnica persiste mesmo após a ressuscitação volêmica adequada
sendo a última a ser restaurada (Ackland etal, 2000).
Em contrapartida, em condições de sepse ou choque séptico, estudos in vitro
utilizando hemolisina de E. coli e modelos experimentais de endotoxemia
demonstram distribuição irregular do fluxo capilar com conseqüente prejuízo da
oxigenação, pois mesmo com uma oferta mesentérica de oxigênio adequada, foi
observado aumento do gradiente gastro-arterial de CO2. (Drazenovic, 1992 apud
Ackland 2000). Além disso, a formação de edema e hemoconcentração sugerem a
perda da integridade capilar (Mayer, 1999 apud Ackland et al, 2000). Estudos em
modelos experimentais demonstram também que embora possamos observar um
fluxo hepatoesplâncnico normal ou até mesmo elevado, existe aumento da demanda
metabólica com aumento do consumo de oxigênio relacionado à liberação de
Revisão da literatura
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citocinas e geração de radicais livres de oxigênio favorecendo o desequilíbrio entre
oferta e consumo de oxigênio (Jakob, 2002).
Contrastando com o território gastrointestinal, o fígado apresenta um
mecanismo de proteção em condições de hipoperfusão denominado resposta tampão
da artéria hepática. Quando existe diminuição do fluxo mesentérico e
conseqüentemente do fluxo da veia porta, ocorre um aumento de 20 a 30% do fluxo
na artéria hepática. A compensação em termos de oxigenação é ainda mais intensa
devido ao maior conteúdo de oxigênio presente na artéria hepática. A vasodilatação
da artéria hepática é mediada pela adenosina que se acumula no espaço de Mall
quando existe redução do fluxo da veia porta. Em condições de choque hemorrágico,
este mecanismo se mantém em perdas sanguíneas de até 30% da volemia. Na sepse
este mecanismo é abolido precocemente (Jakob, 2002).
Perfusão sistêmica e regional
Cada órgão possui uma susceptibilidade particular a hipoperfusão presente no
choque. Desta forma a normalização de variáveis de perfusão sistêmica nem sempre
reflete a perfusão regional (Cheatham, 2005).
Em um estudo realizado com 28 pacientes sépticos, a monitorização
hemodinâmica sistêmica de variáveis de pressão e volume associada à monitorização
regional com tonometria gástrica e clearance hepático de indocianina demonstrou
que na admissão não houve diferença entre os métodos como preditores de
prognóstico. Após a ressuscitação, as variáveis regionais apresentaram melhor
correlação com evolução e mortalidade quando comparadas às variáveis sistêmicas
de volume ou pressão. Finalmente, a ressuscitação foi capaz de restaurar variáveis
Revisão da literatura
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hemodinâmicas e derivadas de oxigênio, mas não foi eficaz na reversão do déficit de
perfusão regional (Poeze et al, 2005).
O choque séptico se caracteriza por uma dissociação entre perfusão sistêmica e
regional. Pacientes com débito cardíaco normal ou até elevado podem apresentar
disfunção orgânica secundária à distribuição irregular do fluxo por alteração do tônus
vascular e disfunção microcirculatória. Além disso, mediadores inflamatórios podem
prejudicar o metabolismo celular gerando a utilização inadequada de nutrientes e
oxigênio (Hollenberg, 1999; 2004).
Índices de perfusão global ou sistêmica:
A pressão arterial média deve ser mantida acima de 60 mmHg visando manter a
perfusão orgânica adequada (Hollenberg, 1999; 2004) e recomenda-se a utilização da
monitorização invasiva através das artérias radial ou femoral (Beale et al, 2004).
O débito cardíaco deve ser avaliado de forma seqüencial e é útil na interpretação
da resposta à ressuscitação volêmica permitindo o cálculo de variáveis do transporte
de oxigênio (Beale et al, 2004).
Enquanto em outras condições de choque a elevação de lactato se correlaciona a
metabolismo anaeróbio por hipoperfusão global, no choque séptico um grande
número de estudos demonstra que a elevação do lactato está relacionada à falência do
metabolismo celular com aumento da glicólise e produção de piruvato e diminuição
da sua excreção pelo fígado caracterizando a disfunção hepática associada à sepse.
Além disso, os níveis de lactato têm boa relação com prognóstico principalmente
quando avaliados evolutivamente (Bakker et al, 1996; Hollenberg, 1999; 2004; Beale
et al, 2004).
Revisão da literatura
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Embora os benefícios da utilização do catéter de artéria pulmonar sejam ainda
controversos, o uso da ressuscitação volêmica guiada por meio da saturação venosa
mista de oxigênio (SvO2) ou da saturação venosa central de oxigênio (SvcO2), em
pacientes sépticos aumentou a sobrevida neste subgrupo de pacientes e sua utilização
em outros subgrupos de pacientes vem sendo objeto de diversos estudos (Marx e
Reinhart, 2006). A diminuição na oferta e utilização de oxigênio pelos tecidos
acompanha e amplifica a resposta inflamatória à infecção. Os tecidos utilizam parte
do oxigênio gerando o consumo de oxigênio (VO2) (Rivers et al, 2005). O oxigênio
presente no sangue que retorna à circulação venosa é um indicador do equilíbrio
entre oferta e consumo de oxigênio. Pode ser medido através da coleta de sangue do
cateter de artéria pulmonar ou continuamente através de catéter de oximetria
posicionado na artéria pulmonar. A saturação venosa mista depende do débito
cardíaco, consumo de oxigênio, concentração de hemoglobina e saturação de
oxigênio arterial. Na ausência de anemia e hipóxia, a diminuição da SvO2 pode
refletir aumento da taxa de extração, e, portanto, ressuscitação incompleta. É
importante ressaltar que o paciente séptico pode apresentar SvO2 elevada por
distribuição irregular do fluxo tecidual e pela presença de hipóxia citopática (Beale et
al, 2004; Reinhart e Bloos, 2005).
A saturação venosa central (SvcO2) é medida por meio da coleta de sangue do
átrio direito ou veia cava superior. Em condições de choque, uma baixa saturação
venosa central apresenta boa correlação com a saturação venosa mista de oxigênio
embora com valores 5 a 6% mais elevados. Além disso, estudos clínicos e
experimentais demonstraram um paralelismo entre SvcO2 e SvO2 em condições de
Revisão da literatura
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choque ou em resposta à terapêutica utilizada (Reinhart e Bloos, 2005; Marx e
Reinhart, 2006).
A saturação venosa central abaixo de 70% ou saturação venosa mista de
oxigênio abaixo de 65% e níveis elevados de lactato arterial sugerem a presença de
hipóxia tecidual global e desequilíbrio entre oferta e consumo de oxigênio. Em geral,
este independe da oferta porque os tecidos são capazes de manter o consumo através
do aumento da taxa de extração de oxigênio. Entretanto, este mecanismo
compensatório é limitado e quando é exaurido passa a haver uma relação de
dependência entre oferta e consumo de oxigênio e conseqüentemente diminuição da
SvO2 e elevação do lactato arterial (Marx e Reinhart, 2006).
Um valor normal ou elevado de SvcO2 ou SvO2 isolado nem sempre reflete a
oxigenação tecidual. Estas medidas se referem à oxigenação sistêmica e não ao que
ocorre nos tecidos. A hipoperfusão pode ocorrer na presença de pressão arterial e
débito cardíaco normais. Particularmente, níveis de SvO2 ou SvcO2 elevados
associados a altos níveis de lactato denotam que apesar da normalização da oferta de
oxigênio, os tecidos não utilizam o oxigênio, por disfunção microcirculatória ou
mitocondrial. Esta síndrome clínica tem sido denominada de hipóxia citopática e é
associada à elevada morbimortalidade (Rivers et al, 2005).
Considerando que a fisiopatologia da sepse compreende distúrbios da
microcirculação, medidas de subprodutos do metabolismo celular se correlacionam
com hipoperfusão tecidual. Desta forma, a diferença entre o CO2 da gasometria
venosa mista ou da gasometria venosa central e o CO2 arterial tem relação inversa ao
débito cardíaco. Uma diferença veno-arterial de CO2 maior do que 5 mmHg sugere
Revisão da literatura
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que o débito cardíaco é insuficiente e existe um quadro de sepse grave oferta-
dependente (Rivers et al, 2005).
Índices de perfusão regional:
A tonometria gástrica é um método simples que acessa a perfusão regional por
meio da medida do CO2 na mucosa gástrica. Com a medida do CO2 na mucosa e do
CO2 arterial é possível calcular a diferença gastro-arterial de CO2 útil como
prognóstico em pacientes sépticos, porém, sua utilidade para guiar a terapêutica
ainda não é definida (Hollenberg et al, 1999; 2004) e seu uso mais amplo tem sido
em pesquisas. Recentemente, a capnografia sublingual, técnica menos invasiva e de
fácil utilização, demonstrou boa correlação com as medidas obtidas com a
tonometria gástrica, porém ainda não existem dados definitivos que permitam sua
utilização rotineira como forma de monitorização em unidade de terapia intensiva
(Hollenberg et al, 2004; Beale et al, 2004).
Apoptose celular
Recentes estudos têm elucidado uma série de mecanismos morfológicos e
bioquímicos que permitem a diferenciação entre apoptose e necrose celular (Szabo,
2005). Uma diferença fundamental entre as duas formas de morte celular é que a
necrose se caracteriza por perda da integridade da membrana celular com exposição
dos componentes do citoplasma no espaço extracelular, e a apoptose por ruptura da
estrutura celular e condensação do núcleo com formação de corpúsculos
encapsulados que, posteriormente, serão fagocitados por macrófagos (Oberholzer et
al, 2001; Szabo, 2005; Perl et al, 2005). Além disso, a apoptose é um processo ativo
e dependente de energia enquanto a necrose não depende de energia (Perl et al,
2005).
Revisão da literatura
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Apoptose e necrose são os extremos de um continuum de morte celular
programada presente em diversas condições fisiopatológicas. A isquemia e hipóxia
tecidual e a conseqüente depleção dos estoques celulares de energia causam um
desequilíbrio iônico com diminuição da atividade da bomba de Na/ K-ATPase e uma
perda de potássio intracelular gerando acúmulo de água e sódio intracelular,
alterações mitocondriais e influxo de cálcio com ativação de proteases (Szabo, 2005).
A apoptose pode ser desencadeada por três vias: extrínseca (tipo1), intrínseca
ou mitocondrial (tipo 2) e stress induzida ou ligada ao retículo citoplasmático
(Oberholzer et al, 2001 Wesche, et al,2005).
A mitocôndria tem papel crucial na necrose e apoptose celular por meio da
liberação de fatores que promovem a apoptose (caspases), ou mecanismos diretos
como diminuição da produção de ATP e alteração no potencial de redução-oxidação
celular (redox) (Oberholzer et al, 2001). Além disso, a presença de radicais livres de
oxigênio gera a disfunção mitocondrial e amplificação do processo de injúria e
necrose com geração de mais radicais livres (Szabo, 2005).
A restauração do fluxo em um tecido previamente isquêmico causa uma lesão
adicional (lesão de reperfusão), mediada em parte pela formação intra e extracelular
de radicais livres de oxigênio e espécies nitrogenadas. A formação de radicais livres
de oxigênio também é desencadeada por mediadores inflamatórios locais ou
sistêmicos, havendo particular importância no choque séptico. Em algumas
situações, receptores de citocinas inflamatórias como o fator de necrose tumoral
(TNF) podem desencadear o processo de necrose celular (Szabo, 2005).
Inicialmente, a apoptose era considerada um mecanismo através do qual
populações celulares específicas poderiam ser ativamente eliminadas dos tecidos
Revisão da literatura
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durante a morfogênese e remodelação tecidual. Entretanto, a apoptose também tem
importante função na resposta imune (Wesche et al, 2005). A apoptose está
envolvida em diversas condições patológicas como na lesão pulmonar aguda,
doenças auto-imunes, doenças inflamatórias crônicas e apoptose linfocitária na sepse
(Perl et al, 2005).
Na sepse, observamos inicialmente um aumento da produção de citocinas pró
inflamatórias e mediadores inflamatórios como óxido nítrico, fator ativador
plaquetário e prostaglandinas que causam disfunção endotelial e um estado pró
coagulante caracterizado por hipotensão, má perfusão tecidual, necrose celular e
disfunção orgânica. A ativação destas citocinas também leva a um desequilíbrio da
resposta imune caracterizado por hiporresponsividade das células T, anergia
linfocitária e alterações na apresentação de antígenos. Esta condição é denominada
de síndrome da resposta anti-inflamatória compensatória (CARS) (Oberholzer, et al,
2001; Le Tulzo et al, 2002; Efron et al 2004).
O papel da apoptose, especialmente em tecidos linfóides no desenvolvimento
da disfunção de múltiplos órgãos (DMOS) e na CARS, ainda não é bem estabelecido.
Diversos estudos sugerem que o desequilíbrio da apoptose de células do tecido
imune tem importância fundamental na disfunção imunológica e disfunção de
múltiplos órgãos presentes na sepse. Entre os fatores que podem desencadear a
apoptose incluem-se glicocorticóides, TNF α, Fas ligand, radicais livres de oxigênio,
óxido nítrico e linfócitos T citotóxicos (Oberholzer, et al, 2001).
O TNF α e Fas ligand são produzidos por macrófagos e células T em resposta à
infecção e estão envolvidos tanto na inflamação como na apoptose celular mediada
através das caspases. As células T e células natural killer (NK) são capazes de
Revisão da literatura
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induzir a apoptose com a liberação de enzimas (granenzima B) que ativam as
caspases 3 e 8 ou através da ativação de Fas ligand. Os glicocorticóides
desencadeam a apoptose mediada pela caspase 9 (Oberholzer, et al, 2001).
As caspases são pró enzimas constituídas de três porções. Sua ativação envolve
um processo proteolítico entre as três porções com a formação de um heterodímero
através da união de subunidades maiores e menores. As caspases inativam proteínas
que protegem as células da apoptose e contribuem para a morte celular através da